PCR é uma das técnicas mais versáteis, robustas e amplamente utilizadas em vários campos da ciência, desde a genômica à indústria de alimentos. É usada no diagnóstico de doenças, rastreio de mutações e identificação de patógenos, seja na Terra ou no espaço (NASA). ”
O que é PCR?
PCR é a abreviação de um procedimento “simples” e extremamente útil em biologia molecular, denominado reação em cadeia da polimerase (derivado do inglês polymerase chain reaction) .
É uma técnica laboratorial, desenvolvida em 1983, capaz de amplificar regiões específicas na sequência do DNA bilhões de vezes, o suficiente para identificá-las por eletroforese capilar (gel de agarose ou poliacrilamida). Para as moléculas de RNA faz-se necessário a síntese do cDNA.
Antes da amostra ser amplificada por PCR, esta será extraída e purificada em uma sala separada da que está localizada a máquina de PCR, uma sala de pré-amplificação.
O método envolve o uso de sequências curtas de DNA chamadas primers (iniciadores) para selecionar a porção do genoma a ser amplificado.
Em linhas gerais, a reação acontece dentro de um termociclador que permite a variação de temperatura. A temperatura da amostra é aumentada e diminuída repetidamente para ajudar uma enzima de replicação de DNA a copiar a sequência de DNA alvo. A técnica pode produzir um bilhão de cópias da sequência alvo em apenas algumas horas.
A PCR foi a base para o desenvolvimento de uma gama de novas tecnologias, proporcionando uma revolução no diagnóstico de doenças. Não à toa, o pesquisador responsável por sua descoberta, Kary Mullis, foi laureado do prêmio Nobel de química em 1993 e a empresa Hoffmann-La Roche (subsidiária da americana da Roche Holdings) adquiriu todos os direitos da tecnologia de PCR da Cetus Corporation (empresa a qual o Kary Mullis era funcionário), por $ 300 milhões e royalties de até $ 30 milhões.
Quais problemas Kary Mullis queria resolver ao desenvolver a PCR?
Estamos em 1983, ano em que a PCR foi desenvolvida. Naquela época, já se sabia da importância do DNA e da associação entre a presença específicas no DNA e determinadas doenças.
Assim como outras descobertas, essa também veio ao acaso, como conta Kary Mullis durante a entrevista do Nobel. A PCR era o resultado possível de uma solução para um problema hipotético que realmente não existia.
Mullis era químico e trabalhava na empresa Cetus, uma empresa de oligonucleotídeo. Ele estava tentando sequenciar polimorfismo de base única (SNPs, do inglês: single nucleotide polymorphisms), porque possuíam importância clínica, por sua associação a doenças.
Ele já havia conseguido automatizar o processo de identificação dos SNPs, e resolveu pensar maneiras de aumentar a demanda por oligonucleotídeos. Usou o modelo da anemia facilforme (doença caracterizada por uma mutação pontual – troca de um único nucleotídeo no gene da beta globina, resultando em uma proteína com alteração no sexto aminoácido da cadeia: onde deveria ter um ácido glutâmico, há uma valina), por se encaixar no modelo de SNPs associado a doença.
No entanto, na época, apesar de alguns avanços, a forma de fazer isso era através do sequenciamento (de Sanger; Maxam e Gilbert), tecnologias demoradas e trabalhosas, em que havia a necessidade de sequenciar boa parte do genoma. O resultado poderia levar três semanas, o que gera muita expectativa para o paciente e atrasa o início do tratamento. Foi então que ele estipulou como meta, que o resultado saísse em um turno em um hospital.
A PCR veio então para resolver dois problemas: isolar a região de interesse, descartando o restante do genoma e gerar quantidade suficiente desta para que possa ser identificada em um gel de agarose.
E assim o fez, juntando o conhecimento que tinha na época. Ele não criou nada novo, tudo estava ali. A PCR mimetiza o que acontece nas células quando o DNA é copiado (replicado) antes da divisão celular, mas é realizado em condições controladas em um laboratório (in vitro).
Os princípios por trás de cada PCR, qualquer que seja a amostra de DNA, são os mesmos. Os reagentes padrão que vão no mix de reação são:
- região de DNA de interesse
- primers (iniciadores) forward e reverse específicos da região de interesse – iniciam a reação de PCR, são desenhados para se ligar (anlear) a qualquer uma das fitas de DNA que deseja sintetizar;
- enzima polimerase de DNA resistente ao calor (Taq™ polimerase) – sintetizam as novas fitas complementares a partir dos modelos de DNA de fita simples. Todas as DNA polimerases possuem 5 ′ → 3 ′ atividade de polimerase, que é a incorporação de nucleotídeos para estender os iniciadores em suas extremidades 3 ′ na direção 5 ‘para 3’;
- os quatro tipos diferentes de nucleotídeos de DNA (dNTPs: dTTP, dATP, dCTP e dGTP) – são os “blocos de construção do DNA” e são necessários para sintetizar a nova fita;
- os sais necessários para criar um ambiente adequado para a ação da enzima (tampão) – garantir as condições certas para a reação
- água livre de nucleases.
A máquina usada é simplesmente chamada de máquina de PCR ou termociclador, pois tem como função primordial variar a temperatura no bloco de aquecimento em cada etapa do processo, alterando a temperatura da reação dentro dos tubos contendo o DNA de interesse.
Esses reagentes são adicionados em um tubo de 0,2mL e levados ao termociclador onde acontecerão as etapas a seguir:
Quais as etapas da PCR?
Etapa 1: Desnaturação
Como na replicação do DNA, as duas fitas na dupla hélice do DNA precisam ser separadas.
A separação acontece pelo aumento da temperatura da reação (reagentes + DNA), fazendo com que as pontes de hidrogênio entre as fitas complementares de DNA se rompam. Este processo é denominado desnaturação.
Etapa 2: Anelamento
Os primers ligam-se às sequências de DNA alvo e iniciam a polimerização. Isso só pode ocorrer quando a temperatura da solução for reduzida. Cada primer se ligará em uma fita.
Etapa 3: Extensão
Novas fitas de DNA são sintetizadas, usando como molde, as fitas originais. Uma enzima DNA polimerase une nucleotídeos de DNA livres. Esta enzima é geralmente Taq™ polimerase, uma enzima originalmente isolada de uma bactéria termofílica chamada Thermus aquaticus. A ordem na qual os nucleotídeos livres são adicionados é determinada pela sequência de nucleotídeos na fita de DNA original (molde).
O resultado de um ciclo de PCR são duas sequências de fita dupla de DNA alvo, cada uma contendo uma fita recém-feita e uma fita original.
O ciclo é repetido muitas vezes (geralmente 30-40), pois a maioria dos processos que usam PCR precisam de grandes quantidades de DNA. Leva apenas 2–3 horas para obter um bilhão ou mais de cópias.
Figura: Etapas da PCR – repetidas por 30 a 40 vezes (ciclos) a depender do protocolo.
Toda a reação acontece em um tubo dentro da máquina, fazendo desse processo um mistério e um pouco abstrato. Para que possamos analisar o resultado, parte do volume dessa amostra será analisado através da eletroforese em gel de agarose (consiste na separação de moléculas carregadas em um campo elétrico). O gel de agarose é a matriz na qual é aplicada a amostra e que permite realizar a separação dessas moléculas. Caso seja positivo, será observada uma banda no gel na altura do tamanho esperado do seu produto.
O resultado é qualitativo: presença ou ausência do seu alvo.
A tecnologia de PCR ainda está em desenvolvimento. Há um contínuo desenvolvimento e aprimoramento dos processos e ferramentas utilizadas, permitindo que o processo seja adaptado para atender às necessidades dos especialistas.
Quais são as aplicações da PCR?
PCR é uma metodologia comum usada em laboratórios de pesquisa médica e biológica, além dos laboratórios de diagnóstico molecular, hospitais, start-ups, empresas e indústrias. Sua aplicação vai desde a identificação de patógenos (seja, na odontologia, em caninos ou felinos, em humanos ou plantas, alimentos ou no espaço) a diagnóstico de câncer, passando por identificação humana paternidade, análise forense), sexagem fetal, microbiologia, desenvolvimento de fármacos, avaliação de expressão gênica ou outros.
Ainda, pode ser utilizada nos estágios iniciais do processamento de DNA para sequenciamento de Sanger ou de próxima geração.
O que é RT-PCR?
É a PCR realizada a partir de uma fita de RNA, que através de uma enzima chamada Transcriptase Reversa (Reverse Transcriptase, ou RT), produzirá uma fita de DNA (chamada de DNA complementar ou cDNA). Esse cDNA é utilizado na PCR.
Qual a diferença da PCR em tempo real (qPCR = PCR quantitativa) e a PCR convencional?
Nos últimos anos, a técnica de reação em cadeia da polimerase (PCR) avançou significativamente no sentido de expandir seu uso e versatilidade, trabalhando com PCR quantitativo em tempo real (qPCR). Os benefícios da qPCR em relação ao PCR convencional incluem: velocidade, reprodutibilidade e capacidade quantitativa. Além das vantagens operacionais, o qPCR é mais sensível e reprodutível, podendo substituir o PCR convencional nas rotinas diagnósticas.
As químicas utilizadas na metodologia de PCR em tempo real permitem a detecção da amplificação durante as primeiras fases da reação. Medindo a cinética da reação nas fases iniciais da PCR, fornecendo uma vantagem distinta sobre o método tradicional, que precisa de uma análise por géis de agarose para a detecção de amplificação por PCR.
Limitação da PCR em tempo real e convencional
Como toda metodologia, há vantagens e limitações que tem que ser conhecidas e respeitadas, entre elas:
- Não identifica mutações novas, ou seja, tem que se conhecer a região de interesse para que sejam desenhados primers e sondas específicas dessa área. É importante estar atento à presença de novas variantes que por ventura ocorram na região de desenho do ensaio podendo gerar resultados falsos positivos. Como é o caso dos ensaios para a identificação do novo coronavírus (SARS-CoV-2) e diagnóstico da COVID-19, em que a maioria não cobre a presença das novas variantes, o que pode gerar resultados falsos positivos e ademais, vale uma ressalva no laudo se resguardando que o teste não identifica essas novas variantes;
- Extremamente variável entre laboratórios, o que dificulta a comparação dos resultados. Cala local usa um tipo de equipamento, reagentes e insumos específicos, gerando testes com sensibilidades e especificidades diversas. Sem contar a variável humano, visto que são teste pouco automatizados;
Domine a PCR em tempo real e esteja preparada (o) para o mercado de trabalho, podendo trabalhar como analista de laboratório, assessor científico, consultor, vendas consultivas e pesquisa e desenvolvimento.
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REFERÊNCIAS:
BUSTIN, S. A. et al. The MIQE Guidelines: Minimum Information for Publication of Quantitative Real-Time PCR Experiments. Clinical Chemistry, v. 55, n. 4, p. 611–622, 1 abr. 2009.
MADDOCKS, S.; JENKINS, R. Quantitative PCR. In: Understanding PCR. [s.l.] Elsevier, 2017. p. 45–52.
TOUMA, M. COVID-19: molecular diagnostics overview. Journal of Molecular Medicine, v. 98, n. 7, p. 947–954, jul. 2020.
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